Eu não lembro ao certo que ano foi. Quero dizer 2014, meu primeiro em São Paulo, quando comecei a descobrir o mundo do empreendedorismo baseado em e voltado para autoconhecimento, mas pode ter sido 2015 ou 2016. Como bom empreendedor em formação, estava atento a novas ferramentas e processos para colocar meus projetos em ação e decidi explorar um site cujo propósito era facilitar a organização de encontros e cursos.
Antes de usar o site, resolvi testá-lo participando de algum encontro gratuito listado nele. Passei os olhos pela lista de eventos e descobri que um deles teria um foco muito inusitado: o Pequeno Príncipe. Os outros encontros e cursos falavam de meditação, técnicas de persuasão e tantas outras coisas úteis, mas a ideia de encontrar um grupo de humanos para conversar sobre o Pequeno Príncipe me pareceu curiosa e divertida.
Eu não poderia estar mais certo, embora também um pouco errado.
A tarde conversando sobre o Pequeno Príncipe e a vida foi incrivelmente maravilhosa. A anfitriã do encontro havia preparado sanduichinhos de bisnaguinha e outros quitutes, além de haver organizado uma programação com diferentes momentos e perguntas geradoras para garantir uma condução fluida e cuidadosa do evento. Simplesmente estar lá já era uma aula de facilitação de encontros.
O que eu estava errado se provou um dos enganos que mais celebrei ao longo da vida: não houve um grupo de humanos, estávamos lá apenas a anfitriã e eu, ninguém mais foi. Nós conversamos sobre o Pequeno Príncipe, mas também sobre nossas vidas, trabalhos, sonhos e paixões. Nós dois tínhamos muitos interesses em comum, o maior deles nossa relação profunda com a contação de histórias.
Daquele encontro, nasceu uma amizade bonita. Jogamos juntos, ela participou de cursos meus, inclusive do Ninho de Escritores, estive em suas casas, conheci seus namorados, ela conheceu os meus. Não nos víamos com frequência, mas cada encontro era repleto de magia e inspiração. Eu admirava a maneira decidida e encantada com a qual ela percebia o mundo.
Uma das muitas memórias de admiração que guardo foi ainda em nosso primeiro encontro. Estava chegando a hora de ir embora e ela me pediu que eu desenhasse um carneiro. Fazia sentido, considerando a proposta de Pequeno Príncipe. Eu hesitei, ela me incentivou, e finalmente pus um carneiro de giz na parede dela. Em retorno, ela me deu um carneiro desenhado em um post-it.
Às vezes a gente conhece alguém e aquela pessoa passa a ter uma associação direta com algo em nossas cabeças. Nesse caso, minha amiga estava diretamente associada com histórias, uma paixão irrefreável pelo Pequeno Príncipe, uma boa dose de competitividade em jogos e, é claro, carneiros.
No final do ano passado, já fazia alguns meses que não conversávamos, algo bem comum em nosso padrão de relacionamento. Pensei nela, senti saudades e escrevi uma mensagem no Instagram.
Ela não me respondeu, mas não pensei nada a respeito. Nosso ritmo de conexão sempre permitiu semanas e até meses entre uma conversa e outra, então nem estranhei.
No início deste ano, fui informado que ela faleceu.
Não sei como, não sei nem exatamente o quando, mas não importa, né?
Ela foi uma pessoa maravilhosa que a vida me presenteou e com a qual nunca mais viverei novas experiências. O que posso fazer é celebrar as histórias que compartilhamos e contar para o mundo sobre a criatura fabulosa que me sempre me inspirava a ver o mundo com um tantinho a mais de magia.
E carneiros. 🐏
Com carinho,
Tales
Meus sentimentos <3
Meus sentimentos, Tales! Que bom que você pode desfrutar dessa amizade do jeito que fazia sentido pra vocês ❤️