Nesta semana conduzi minha segunda oficina de escrita aqui no Japão. Como de costume, saí do encontro me sentindo renovado ao perceber que meu trabalho resultou em um grupo de humanos inventando coletivamente um ambiente de prática de segurança para fomentar criatividade e conexão.
O texto de hoje será, além de atrasado em um dia por conta de uma semana pesada no trabalho corporativo, curto. Quero apenas apontar três elementos que têm sido centrais na experiência do Ninho de Escritores e em todos os ajuntamentos que proponho, sejam para aprender ou brincar.
Esses elementos são princípios que orientam minha prática e que reforço por meio de regras e acordos de convivência.
Apreciação
A primeira coisa que peço para observarmos quando lemos alguma coisa é: o que apreciamos neste texto? O que, no meu contato com essa história, poesia, ensaio etc. me atrai, encanta, provoca ou seduz?
É comum estarmos sempre no registro da crítica, daquilo que não funciona, que não gostamos, que não queremos. O convite da apreciação é encontrar conexão mesmo com aquilo que normalmente rejeitaríamos. Isso pode ser muito difícil; eu não saberia dizer quantas vezes recebi um texto para ler e pensei “nossa, isso é muito ruim”. Com o tempo, porém, fui entendendo que o “muito ruim” estava conectado com minhas expectativas sobre como essa outra coisa deveria ser, em vez de um olhar genuíno para o que aquilo de fato é.
Curiosidade
Após as apreciações, oriento o grupo para semearmos perguntas para o texto, para a pessoa que escreveu, para a humanidade… De novo, trata-se de um exercício de atenção e conexão. Não estamos em busca de respostas prontas nem de exercitarmos nosso olhar sobre a escrita. Queremos exercitar nosso olhar na direção da escrita.
A curiosidade é um presente que oferecemos para quem escreve, que durante os encontros tem o privilégio de encontrar um grupo de humanos dispostos a oferecerem aquilo que têm de mais precioso: tempo de vida e atenção.
Brincadeira
Por fim, brincamos com os textos das outras pessoas. A partir de perguntas como “se esse texto fosse meu, o que eu faria diferente?” ou “o que eu mudaria no texto para que ele me empolgasse mais?”, convido as participantes das minhas oficinas para que compartilhem suas ideias. Há vezes em que inclusive reescrevemos textos de colegas, geralmente resultando em criações fabulosamente diferentes umas das outras.
O jogo não está em descobrir quem “escreve melhor” ou em “corrigir” o texto do outro. O jogo está em lembrar que estamos juntos para cultivarmos nossas habilidades coletivamente, e a gente cresce e aprende muito mais quando descobrimos como o mundo pode ser plural do que quando alguém nos aponta um caminho correto que precisamos seguir.
Algum dia ainda escreverei um livro sobre isso tudo. Por favor me conta se esse é um tema que te interessaria ler mais a respeito.
Com carinho,
Tales
Sim, eu me interessaria! Aliás, ultimamente eu estava só "lendo sobre o escrever" e recentemente estive em um grupo de escrita para escrevermos pequenos contos, e foi justamente o que eu estava precisando: colocar em prática, ler coisas dos outros, botar a criatividade pra funcionar.
Sim, é algo que eu gostaria de ler mais interagir com esse tipo de conteúdo. Uma dúvida que ficou minha mente: como você consegue unir as pessoas em volta de um grupo de escrita? No Japão!