Finalmente recebi o resultado do exame de proficiência em língua japonesa que fiz em julho. Sim, dois meses depois, dá pra acreditar?
O exame possui cinco níveis, começando pelo N5, que indica um conhecimento rudimentar no idioma, passando pelo N3, que representaria uma capacidade conversacional cotidiana, até o N1, que sugere um domínio profundo do idioma e de seus meandros mais complexos. Quando me inscrevi, optei pelo N3.
Eu já havia prestado o exame antes, cerca de dois anos atrás, quando estava prestes a vir ao Japão pela primeira vez. Na época me inscrevi para o N4 e não passei. Queria chegar aqui com um certificado de que meu tempo de sala de aula havia significado um aprendizado concreto. Porque tem isso na vida, né, as pessoas me perguntam há quantos anos eu estudo o idioma como se isso significasse alguma coisa, da mesma forma que empresas pedem cinco anos de experiência em uma atividade, como se tempo fazendo algo sugerisse que a pessoa necessariamente está aprendendo a fazer melhor. Muitas vezes não está.
Sempre que me perguntam sobre quanto tempo já dediquei aos estudos, explico que no início eu estudava japonês mais como um hobby e que só comecei a me dedicar um pouco mais quando cheguei ao Japão em outubro de 2022. Isso não é totalmente verdade, mas costuma explicar de forma satisfatória o suficiente o porquê de eu ter começado meus estudos em 2017 e ainda assim encontrar tanta dificuldade o idioma.
Nesses últimos anos, entendi algumas coisas sobre meus limites com o aprendizado de japonês. Uma delas é que aprender japonês tem sido muito difícil para mim, mais do que para algumas das pessoas ao meu redor. Aceitar isso foi dolorido, porque cresci acostumado a ser o cara que entendia as coisas fácil e que não precisava estudar muito para se destacar intelectualmente. Desde que vim ao Japão, acompanhei outras pessoas no processo de desenvolverem um entendimento da língua e pude perceber que meu desenvolvimento está caminhando num ritmo que me desagrada.
Eu sei que cada pessoa aprende no seu próprio ritmo. Eu sou um educador e já me deparei com isso incontáveis vezes. Entendo que as condições, os esforços e os resultados sempre serão diferentes para cada indivíduo. Ainda assim, agora que chegou a minha vez de topar de cara com uma montanha mais alta do que tenho conseguido escalar, preciso fazer esforço para lembrar que essa sempre foi uma possibilidade. Não conseguir sempre é uma possibilidade.
Eu não passei no exame que fiz em julho.
Embora tenha conseguido pontos suficientes em vocabulário e escuta, meu ponto fraco foi a leitura. Me dói assumir isso, especialmente depois de passar muitos anos me definindo como alguém que escreve e que apoia pessoas a se tornarem escritoras (e portanto, leitoras) melhores.
Depois de reconhecer a falha, chegou o momento de uma nova decisão: fazer o exame em dezembro ou não? Meu plano inicial era, qualquer que fosse o resultado, não fazer a prova, já que o Ayrton estará visitando o Japão e quero aproveitar todos os momentos possíveis com ele. Porém, mudei de ideia e decidi fazer a prova, e o motivo também tem a ver com perceber meus limites.
Minha vinda ao Japão em 2024, meros sete meses após ter retornado de Tóquio para o Brasil, tinha um propósito claro: determinar se eu queria continuar morando aqui além do limite legal imposto pelo visto de estudante. Com meu visto atual, posso continuar no Japão até abril de 2025, desde que eu continue pagando e frequentando a escola. Para ficar aqui além disso, será necessário mudar meu visto, provavelmente para um de trabalho, o que requer uma empresa patrocinar tal visto. Mesmo que isso aconteça, meu direito de permanecer aqui estará dependente da aprovação de uma ou outra empresa, o que está longe de ser algo que considero acolhedor.
Além disso, os pedaços de mim que não cabem no Japão têm me feito falta. Exemplo simples: jantando no restaurante, vi um celular caído no chão e identifiquei que pertencia a uma mulher sentada próxima de mim. Ela estava entretida conversando com uma amiga e não havia percebido que o telefone não estava mais sobre a mesa. A qualquer momento alguém poderia passar e pisar no telefone sem perceber. Eu interrompi a conversa das duas e informei que o aparelho havia caído, algo que eu nem pensaria duas vezes antes de fazer no Brasil, mas aqui no Japão me senti como se estivesse cometendo uma ofensa terrível, tanto pela interrupção quanto pela dificuldade em explicar minha intenção sem gesticular profusamente.
Já não tenho mais conseguido imaginar um bom futuro para mim como residente no Japão, o que significa que dezembro será minha última oportunidade de fazer o exame de proficiência ainda morando aqui e estudando diariamente na escola.
Minha próxima pergunta, portanto, era: qual nível tentar? Tento o N3 de novo ou tento o N2, já que terei mais uns meses de estudo pela frente? Foi nesse momento que percebi algo importante sobre meus limites: eles não são definitivos nem imutáveis, mas apontam para o que será mais provável. Eu não sei qual é o meu limite de aprendizagem, se é que isso existe, mas sei o quanto da minha vida estou disposto a dedicar aos estudos nos próximos três ou quatro meses. E francamente, não é o suficiente para ter certeza de que passarei no N2, então tentarei o N3 outra vez.
Quero voltar do Japão com um certificado, por mais que seja só um papel dizendo que passei num teste. Sim, eu sei que outras experiências também podem comprovar minha habilidade, mas meu ego está ferido. Se eu tentar o N3, acho que consigo passar em dezembro. Se eu não passar, provavelmente escreverei outro texto sobre reconhecer meus limites, mas isso é um problema para o Tales do ano que vem.
Acredito que se eu tivesse dedicado mais tempo e esforço no passado, teria aprendido melhor. Entretanto, aprender japonês não é a única coisa à qual tenho dedicado tempo e energia. Reconhecer o limite do quanto estou disposto a dedicar a algo me ajuda a tomar decisões melhor informadas.
Pode não ser a história que eu queria contar, mas é a história que estou disposto a viver.
Com carinho,
Tales
Acho que é sempre doloroso reconhecer os próprios limites. Ainda mais para alguém que está acostumado a viver o máximo de seus interesses. Consigo lhe entender. Também sou assim. Ficaria decepcionado da mesma maneira. Mas, não tentaria novamente. Quando morei na França sentia que meu francês já era bom o suficiente para viver e trabalhar, mas poderia melhorar, entretanto, optei por não estudar e viver mais intensamente e experiência de viver e trabalhar em um outro país. Acho que foi uma das decisões mais acertadas da minha vida. Não tenho um certificado que comprove minha proficiência, mas vivi intensamente a experiência e isso foi revelador.
Eu me identifiquei bastante! Fiz o Cambridge Assessment em 2019 basicamente para ter um papel dizendo que sou "bão" em inglês. E na prova minha nota mais baixa foi na escrita (provavelmente porque me empolguei e passei do limite permitido).