Nudez é uma coisa curiosa, né?
Venho aqui toda a semana e me rasgo um pouquinho, compartilhando momentos de vulnerabilidade, no que talvez possa ser considerado um ato de desnudar-me.
(Aliás, por que é desnudar e não nudar?)
Mesmo com as palavras às vezes penso muitas vezes antes de admitir em público coisas que são muito minhas, mas esse é um exercício que já faço há mais tempo, então seguro o tranco – quando acho que vale – e partilho.
Com o corpo, a história é outra.
Venho fazendo aulas de pole dance há um par de meses, mais ou menos. Desde a aula teste, cultivo uma sementinha de dúvida se estar num estúdio de dança é mesmo para mim, mas continuo na força da teimosia.
Bermuda e camiseta, essa é a roupa que costumo usar durante as aulas. Vejo as moças com biquinis esportivos e shortinhos curtos e alguns caras só de sunga, mas até recentemente me parecia mais seguro manter minha bermuda e camiseta.
Umas duas aulas atrás, subi na barra e tentei uma posição nova, mas por mais que fizesse força, continuava deslizando. Fazia força e deslizava. Pegava na barra de outro jeito e deslizava outra vez.
– É a camiseta – comentou a professora. – A pele ajuda a segurar o corpo na barra.
Na aula seguinte, praticamos um movimento semelhante. Desta vez, percebi eu mesmo o quanto minha camiseta estava me atrapalhando. Havia dois colegas homens na sala, um deles só de shortinho – nem vi quando ele tirou a camiseta – e o outro com a blusa puxada para cima até a altura dos mamilos.
Tirar a camiseta poderia me ajudar, mas eu estava com medo. Do quê, eu não sei, só sei que refiz os passos de uma dança à qual já estou muito acostumado. Quero tirar, mas não sei se posso. Quero tirar, mas não sei se devo. Passo pra cá, passo pra lá, dúvida, dúvida, dúvida.
Mas eu não tinha dúvida.
O que eu tinha era só medo.
O mesmo medo que sinto quando preciso ligar para alguém, ou quando vou entrar em um lugar novo, ou quando não conheço ninguém e preciso puxar conversa em outro idioma. Ou que senti em Barcelona, numa praia nudista, quando um amigo perguntou se eu continuaria de sunga ou se ficaria nu.
Esse medo é um velho conhecido meu, alimentado por uma infinita sequência de ideias e valores sobre inadequação, comparação e rejeição social.
Ele sussurra: o que vão pensar de mim?
Talvez medo nem seja a palavra certa, mas o que quer que isso seja, desta vez me encontrou num outro momento de vida.
Queria dizer que respirei fundo e tomei uma decisão pensada, sensata, fundamentada na percepção de que esse medo todo pode até ter me servido no passado mas que nesse momento já não cuida mais de mim, porém o que aconteceu foi muito menos pensado do que meu texto poderia fazer parecer.
Num movimento súbito, tirei a camiseta, olhei para os lados para ver se alguém tinha percebido ou reparado, cada um estava concentrado em suas próprias vidas.
Joguei a camiseta de lado e subi na barra novamente.
Ao menos dessa vez, eu estava me importando mais com o que eu mesmo ia pensar de mim se me permitisse paralisar.
(E caso tu esteja pensando, o que eu ia pensar de mim é: “OK, isso é difícil pra ti, não foi dessa vez, a gente tenta de novo na próxima!”, porque se tem uma coisa que eu já consegui fazer nessa vida é acalmar o chicote interior.)
O que vão pensar de mim parece uma preocupação tão vaidosa, né?
Esse é um medo que norteia muitas das minhas escolhas.
Ou melhor, é um receio que bloqueia muitas das minhas escolhas. Já deixei de fazer muitas coisas porque, no fundo, estava com medo de ser percebido como ruim, inferior, desprezível – nomes que aprendi na época do bullying escolar e que, aparentemente, seguem doendo ainda hoje.
Muitas vezes na vida já encontrei uma dose de autoconfiança e achei que finalmente havia superado esses fantasmas que seguem ecoando desde lá do passado.
Hoje entendo que os fantasmas continuarão vindo, seja na hora de tirar uma camiseta, seja na hora de mandar uma mensagem num grupo cheio de pessoas com as quais não tenho ainda intimidade, ou ainda quando olho para um restaurante novo com porta fechada e preciso falar em japonês para interagir.
O que muda é que hoje tenho ferramentas melhores para lidar com esses fantasmas quando eles surgem, para cuidar de mim mesmo quando não dou conta e para apoiar outros humanos que também precisam de carinho e suporte.
Lembrei dessa tirinha sobre autodefesa. Se para me defender fisicamente, preciso acreditar que minha integridade física vale mais do que a do meu agressor, então para enfrentar esse medo, preciso acreditar que o que eu penso de mim vale mais do que o que os outros vão pensar de mim. Isso se pensarem em mim.
O que eu penso de mim vale mais do que o que os outros vão pensar de mim.
Queria tatuar isso na minha mente.
Com carinho,
Tales 🦊
Que texto profundo, sensível e necessário para nos lembrarmos quando passamos por situações semelhantes. Estamos sempre preocupados com a opinião do outro que balizamos o que pensamos sobre nós sobre o olhar do outro que, na maioria das vezes, é carregado com suas próprias dores e limitações. Importante esse passo, olhar para dentro de si e lembrar que precisamos não apenas acolher nossa criança ferida, mas curá-la também.
Eu amei o texto, vale ressaltar que vc tem que seguir seu coração sem se preocupar com opinião alheia. O q vão pensar de vc n importa, pois ser nós mesmos ter opinião de quem somos é o caminho para encontrar a felicidade pela. Julgar alguém é suicídio em gota toma veneno e espera q o outro morra. Então amigo siga em frente sou sua fã e te admiro muito. Abraços.